quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Violações de Direitos Humanos dos Trabalhadores

Transcrevemos abaixo o capítulo "Violações de Direitos Humanos dos Trabalhadores" - págs: 55-86 do Relatório Final - volume II, Textos Temáticos - da Comissão Nacional da Verdade concluído em dezembro de 2014 (ao final da postagem link para baixar o texto integral do Relatório):

Este texto foi elaborado sob a responsabilidade da conselheira Rosa Maria Cardoso da Cunha. Os dados que o subsidiam e são apresentados foram reunidos e sistematizados pelo Grupo de Trabalho nº 13 da Comissão Nacional da Verdade, sobre Ditadura e Repressão aos Trabalhadores e ao Movimento Sindical (GT-13). Baseia-se em trabalho coletivo produzido por representantes de dez centrais sindicais brasileiras, comissões e comitês estaduais e municipais da verdade, entidades, associações, centros de memória de trabalhadores e organizações de trabalhadores ex-presos políticos. O GT-13 estabeleceu como linhas de investigação 11 temas, contando com o trabalho de pesquisadores. Nota1

  Violações de Direitos Humanos dos Trabalhadores


A) Antes de 1964: os projetos político-econômicos contrapostos

Os trabalhadores e seu movimento sindical constituíram o alvo primordial do golpe de Estado de 1964, das ações antecedentes dos golpistas e da ditadura militar.Nota2 Essa afirmação evidencia-se pela violência anterior ao golpe, praticada nos estados em que os governadores, forças militares e policiais, articulados com o governo norte-americano, já estavam conspirando contra o governo federal, bem como pelos duros ataques, desde as primeiras horas, impostos aos trabalhadores e a seus órgãos representativos de classe. Evidencia-se, também, pelas políticas econômicas e sociais desenvolvidas pela ditadura militar e pelo número de vítimas das graves violações sofridas, na comparação com vítimas de outras classes sociais.

Link para baixar o Relatório Final (versão integral)
Antes de 1964, contrapunham-se no país diferentes projetos sobre a organização do Estado e da sociedade brasileira. Essas visões contrapostas projetavam-se na construção de dois blocos fundamentais: o primeiro lutava pelas denominadas reformas de base (agrária, urbana, educacional, eleitoral, administrativa, tributária) e, entre outras questões, pela regulamentação da remessa de lucros ao exterior, pela nacionalização de empresas estrangeiras estratégicas para o desenvolvimento nacional e por conquistas trabalhistas. De forma geral, os trabalhadores apoiavam essas reformas. Estavam especialmente interessados na reforma agrária, na reforma urbana (que lhe garantiria melhores condições de moradia e acesso ao espaço nas cidades), na nacionalização e criação de empresas, inclusive estatais, e na ampliação das conquistas e direitos trabalhistas, com particular destaque para o aumento dos salários.

O Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), organismo criado em 1962 para unificar e coordenar nacionalmente as lutas dos trabalhadores brasileiros, mobilizava-se, especialmente, por reivindicações como o aumento de 100% do salário mínimo, o novo rezoneamento desse salário, com a aproximação dos níveis salariais em todo o país, a aplicação efetiva do já instituído salário-família, o direito de greve, sem as restrições legais e práticas em curso, a redução do custo de vida, as lutas camponesas e o pagamento do 13º salário. O CGT apoiava, também, a elegibilidade para analfabetos e suboficiais das Forças Armadas e as reformas de base. Antes do golpe, o CGT — ele mesmo uma entidade não reconhecida pela estrutura sindical oficial — estava articulando uma proposta de reforma da estrutura sindical e defendia a autonomia e a liberdade dos sindicatos, o que seria discutido em seu congresso, que não chegou a ocorrer.

O segundo bloco organizava-se em torno do projeto de modernização conservadora proposto pela classe empresarial urbana. Do ponto de vista do campo, desde o início da década de 1950, a reivindicação mais vocalizada era a mecanização da agricultura. Em 1955, a Confederação Rural Brasileira — CRB, na III Conferência que realizou em São Paulo, qualificava como baixo o nível técnico da lavoura e da pecuária existente no país e enfatizava a “indiscutível conveniência de elevar-se a produtividade de nossa agricultura, seja em termos de área cultivada ou de força de trabalho empregada”.Nota3 Os proprietários de terra reclamavam, então, para eles próprios, créditos e assistência técnica, opondo-se radicalmente à extensão da legislação trabalhista ao campo, à associação dos trabalhadores em sindicatos e às reformas, em geral.

Os blocos mencionados tratavam os problemas econômicos e políticos em curso de forma completamente diferente. Consideremos como exemplo a greve de...

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Recomendações do Grupo de Trabalho Ditadura e Repressão aos Trabalhadores e Trabalhadoras e ao Movimento Sindical

O GT dos Trabalhadores entregou à Comissão Nacional da Verdade, em 8 dezembro 2014, um relatório com o resultado da pesquisa, coleta de testemunhos e documentos sobre a perseguição e repressão aos trabalhadores e trabalhadoras durante o período da ditadura militar de 1964.


 










Link para baixar o arquivo em pdf


sexta-feira, 28 de novembro de 2014

II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil

Texto do jornalista Rafael Freire, presidente do Sindicato dos Jornalistas da Paraíba e membro do Comitê MVJ-PB e publicado na página do Facebook da DHnet Direitos Humanos
Link para o texto no Facebook


Prezados companheiros e companheiras,

Repasso agora a todos um breve relato e as resoluções do 2º Encontro Norte/Nordeste pela Memória, Verdade e Justiça, realizado nos dias 22 e 23 de novembro, no Recife Plaza Hotel, na capital pernambucana. O evento foi dedicado ao escultor e militante comunista Abelardo da Hora, falecido no dia 23 de setembro de 2014. Seguem anexadas também uma matéria publicada na Folha de Pernambuco, o poema em homenagem à Marighella e a carta de saudação enviada por Rosa Cardoso.

Primeiramente, para mim, como membro do Comitê MVJ da Paraíba, ficou a satisfação de participar do 2º Encontro Regional, tendo o primeiro acontecido em João Pessoa, no ano passado. E não só por ter sido um desdobramento do primeiro, mas, de fato, porque representou um aprofundamento dos debates e mostrou o surgimento dos Comitês de Alagoas e Sergipe (em fase de construção) e diversos avanços nas atividades dos comitês e na conjuntura nacional.

Este 2º Encontro foi realizado pelos esforços dos membros do Comitê MVJ de Pernambuco, que tiveram a capacidade de prepará-lo, sem custos aos participantes, por meio do prestígio de que gozam em diversos setores, mesmo diante da escassez de apoio institucional neste final de ano pós-eleitoral. Foram militantes, apoiadores, admiradores, amigos que fizeram o encontro acontecer.

Cerca de 100 pessoas se fizeram presentes no ato de abertura, após uma apresentação dos violeiros Antônio Lisboa e Leonel, que nos falaram, de uma forma diferente da que estamos habituados, sobre a luta contra a Ditadura Militar, homenageando também os que combateram o regime. À mesa, o deputado Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão da Verdade Rubens Paiva, da Assembleia Legislativa de São Paulo, proferiu uma palestra sobre a atualidade da luta pela MVJ e as perspectivas sobre o relatório da CNV, a ser apresentado no próximo dia 10 de dezembro. Falaram depois o secretário-executivo de Justiça e Direitos Humanos do Governo de Pernambuco, Paulo Moraes, os representantes dos Comitês da Paraíba (José Calistrato), do Rio Grande do Norte (Roberto Monte) e de Pernambuco (Amparo Araújo e Edival Cajá), o secretário-executivo da Comissão Estadual da Verdade de Pernambuco, Henrique Mariano, e a vice-presidente da Comissão Estadual da Verdade da Paraíba, Lúcia Guerra. Também foi lida a carta de saudação enviada pela comissionária da CEV, Rosa Cardoso, prestigiando o Encontro.

A tarde foi dedicada aos grupos de debate, nos quais os Comitês de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Bahia, Teresina, Ceará, Alagoas (recém-organizado) e uma Comissão Pró-Comitê de Sergipe tiveram espaço para repassar os informes sobre as atividades locais e para debater a minuta da Carta do Encontro. No geral, os informes dos Comitês registraram muitas atividades em torno dos 50 anos do Golpe, além de outras ações.

À noite, a organização do evento cuidou ainda para que os participantes conhecessem os monumentos do sítio de memória localizado na Praça Padre Henrique, às margens do Rio Capibaribe, na Rua da Aurora, onde está o Monumento Tortura Nunca Mais, a Calçada da Memória, o monumento ao Nunca Mais e o monumento ao Padre Henrique. Logo após, em visita ao Memorial da Democracia, construído na sede do antigo Dops, foram lançados livros, houve a exposição fotográficos e painéis sobre a ditadura, além de muita poesia revolucionária por conta de Pedro Laurentino e Marcelo Mário de Melo.

No domingo pela manhã, a plenária final se debruçou sobre a minuta da Carta, que foi democraticamente debatida e emendada até seu resultado final, demonstrando grande coesão entre os presentes. Na abertura do plenário de aprovação da Carta os delegados foram brindados pela emocionante saudação de Agassiz Almeida, advogado das Ligas Camponesas, promotor e Deputado cassado na Paraíba pelo Golpe Militar de 1964 e Deputado Constituinte de 1988. 

A noite do sábado terminou com uma homenagem ao comandante Carlos Marighella, pela passagem dos 45 anos de sua imortalidade , com um pronunciamento de Antônio Carlos Fon, ex-preso político da ALN e membro do Comitê Paulista MVJ e ainda foi lido e aprovado no plenário o poema Por um Ideal de Liberdade de autoria de Rodrigo Deodato, do Comitê MVJ-PE e coordenador executivo do Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares de Pernambuco (Gajop).

Por fim, ficou decidido por unanimidade realizar o 3º Encontro, no início de segundo semestre de 2015, no Estado do Ceará, privilegiando um dos Comitês mais ativos e se aproximando geograficamente dos comitês da Região Norte, tendo se encerrado os trabalhos, às 13 horas, com um almoço de confraternização no próprio hotel, com todos os presentes no evento.

domingo, 23 de novembro de 2014

II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil

Notícia do Blog da Folha de Pernambuco


Leia a Carta do Recife, aprovada no II Encontro


Carta do Recife - II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil

Recife, 23 de novembro de 2014 

“Somos o que a memória guarda” (Fernando Brant).
Sem ela, morre a identidade e se oculta a verdade para açoitar a justiça.

O 2º Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil, que congrega os comitês, coletivos e organizações diversas que lutam pela preservação da memória, busca da verdade histórica e efetivação da justiça de transição, realizado em Recife (PE), nos dias 22
Abelardo da Hora
e 23 de novembro de 2014, dedicado ao escultor e militante político Abelardo da Hora, torna pública a seguinte carta aberta aos brasileiros e brasileiras.

Um dos maiores atos de resistência da humanidade é o resgate, a valorização e a preservação da memória individual e coletiva sobre a qual se assentam os elementos fundamentais e necessários à construção de uma sociedade que tenha a verdade como instrumento basilar para se constituir justa, buscando a igualdade como valor universal entre os semelhantes.

Ao longo dos anos, acumulamos bastante neste debate e reunimos uma quantidade extraordinária de documentos, depoimentos e resoluções, a exemplo dos encontros de Cajamar (SP), abril de 2012, João Pessoa (PB) - julho de 2013 e Vila Velha (ES) - maio de 2014.

Contudo, em que pesem os avanços democráticos obtidos desde a Constituição de 1988, ainda não efetivamos a justiça de transição, mesmo após a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), cujo objetivo é apurar as graves violações dos direitos humanos ocorridas no Brasil entre 1946 e 1988.

Ainda persistem gritantes violações dos mais elementares direitos da maioria da população. No exato momento em que esta Carta é tornada pública, existe um negro, uma mulher, um membro da comunidade LGBT, um indígena ou um camponês, um pobre, enfim, sendo espancado, torturado, seviciado, humilhado por algum agente público a serviço do Estado.

A prática da tortura e do assassinato ainda é utilizada como método preferencial e fomentador dos inquéritos policiais, porque os agentes que a praticam, mesmo cientes do crime que cometem, carregam consigo a certeza absoluta da impunidade. Pior. Há ainda uma cumplicidade de setores da sociedade, que findam por aplaudir silenciosamente esta excrescência.

Tal legado foi institucionalizado durante o regime ditatorial e só será possível extirpá-lo quando todos os crimes perpetrados por agentes públicos, policiais ou não, no passado e no presente, forem apurados e rigorosamente punidos. Trata-se de crimes de lesa-humanidade e, por isso mesmo, são abomináveis, inesquecíveis, imperdoáveis e imprescritíveis.

Como evidencia a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA sobre o caso brasileiro, não há sentido em se falar de anistia para quem torturou, seviciou, assassinou e ocultou cadáveres de cidadãos e cidadãs que se encontravam indefesos e sob a guarda do Estado. Isto representou, na verdade, uma autoanistia. Como anistiar quem nunca foi punido? Ao contrário, esses senhores foram agraciados com medalhas, promoções e empregos, cortejados nos salões das elites econômicas e recebidos com pompas nos palácios e ministérios. Encaminhá-los à barra da Justiça para que sejam julgados e punidos exemplarmente é dever de todos (as) os (as) democratas do Brasil.
Enquanto esse passado recente não for minuciosamente revolvido, esclarecido, julgado e condenado, sendo enterrados seus tentáculos, continuará ameaçando o presente, como acontece nos vários casos de desaparecimento, no extermínio da juventude pobre e, em geral, dos moradores da periferia geográfica e social do Brasil.

Todo este entulho autoritário resulta na sobrevida da ideologia fascista em setores da sociedade, especialmente dentro das Forças Armadas e das Polícias Militares, claramente perceptível no currículo aplicado nas escolas militares, na existência da Justiça Militar e nas relações com a Escola das Américas.

Na atual conjuntura brasileira, a defesa e o aprofundamento da democracia precisam ser reforçados para que se respeite o resultado das eleições e se faça uma reforma política. Nossa frágil democracia ainda é manipulada sobremaneira pelo poder econômico e pelo monopólio dos meios de comunicação.

Reconhecemos os esforços da Comissão Nacional da Verdade e esperamos que seu papel histórico seja cumprido com a apresentação - no relatório final - dos casos pormenorizados dos horrores a que nosso país foi submetido por 21 anos consecutivos, da relação dos brasileiros e brasileiras mortos e desaparecidos, do nome de cada agente do Estado e de elementos colaboradores do regime envolvidos direta ou indiretamente nesses crimes, para que sejam julgados exemplarmente pela Justiça e pela História.

A realização deste 2º Encontro e a divulgação do relatório da CNV são, para nós, um marco nesta luta, mas o compromisso do Movimento Memória, Verdade e Justiça é anterior e estará além da existência de qualquer comissão oficial.

Ressaltamos ainda a importância histórica daqueles que tombaram na luta pela democracia no Brasil, bem como o papel de setores progressistas da Igreja, sintetizados aqui na figura de dom Hélder Câmara, e dos trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade. 

Continuaremos a mobilizar o povo brasileiro até alcançarmos o resgate dos restos mortais dos companheiros e companheiras assassinados (as) e a punição aos torturadores. 

- Lembrar é resistir!
- Para que ninguém esqueça e nunca mais aconteça!
Recife, 23 de novembro de 2014

Comitês Memória, Verdade e Justiça do Ceará
Comitê Memória, Verdade e Justiça do Rio Grande do Norte
Comitê Memória, Verdade e Justiça de Teresina
Comitê Memória, Verdade e Justiça da Paraíba
Comitê Memória, Verdade e Justiça da Bahia
Comitê Memória, Verdade e Justiça de Alagoas (em construção)
Comitê Memória, Verdade e Justiça de Sergipe (em construção)
Comitê Memória Verdade e Justiça do Amazonas
Comitê Memória, Verdade e Justiça do Pará
Comitê Memória, Verdade e Justiça do Maranhão
Comitê Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco

II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil





Cartaz com o poema de Rodrigo Deodato em homenagem ao comandante Carlos Marighella, pela passagem dos 45 anos de sua imortalidade. Homenagem aprovada em 22 de novembro de 2014 pelos participantes do II Encontro do Movimento MVJ do Norte e Nordeste.

sábado, 22 de novembro de 2014

Mensagem enviada por Rosa Cardoso, da Comissão Nacional da Verdade, aos participantes do II Encontro dos Comitês de Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste


Queridos companheiros dos Comitês de Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste.

Como antecipei ao companheiro Cajá estive envolvida em vários compromissos em São Paulo e Brasília durante a semana e em seu final estarei participando de Seminário em Santos, sobre as cidades da Baixada ocupadas pela ditadura de 1964.

Quero entretanto saudar a iniciativa deste encontro e afirmar meu otimismo em relação às nossas lutas por memória, verdade e justiça. Concluiremos 2014 entregando à Presidenta e aos Poderes da República um relatório que registra o resultado de propostas fundamentais dos Comitês, dos ativistas 
interessados na Justiça de Transição e dos familiares e vítimas dos anos de chumbo.

No Relatório nós enquadramos as graves violações de direitos havidas durante a ditadura como crimes de lesa-humanidade; expusemos extensamente as denúncias das vítimas e testemunhas sobre estes crimes; comprovamos a existência de um conjunto de locais de tortura e extermínio como política oficial do Estado nos anos de ditadura; nomeamos centenas de autores dos crimes cometidos; recomendamos a responsabilização criminal, civil e/ou administrativa dos autores e o afastamento de todos os dispositivos concessivos de autoanistia aos responsáveis. Portanto, o Relatório da CNV representa uma vitória de nossa luta. 
Estou certa que a nossa energia e persistência construirá vitórias mais significativas em 2015 no campo da justiça.

Fraternalmente, 
Rosa Cardoso

II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil

 

Memória fotográfica do II Encontro









Leia a Carta do Recife, aprovada no II Encontro


II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil


Notícia do Jornal do Commercio on line

terça-feira, 11 de novembro de 2014

II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste do Brasil


Programação do II Encontro do Movimento Memória, Verdade e Justiça do Norte e Nordeste, a realizar-se em Recife nos dias 22 e 23 de novembro de 2014. 
O nosso evento tem o objetivo de trocar experiências entre os Comitês e Comissões dos estados, o coroamento das nossas atividades de repúdio aos 50 anos da ditadura militar fascista e as perspectivas do movimento em 2015.
O I Encontro aconteceu nos dias 06 e 07 de julho de 2013 em João Pessoa, por decisão dos Comitês do Nordeste, no Encontro Nacional de Cajamar em 27 e 28 de abril de 2013.
Todos os estados Já confirmaram presença: AM, PA, PI, CE, RN, PB, PE, AL, SE e BA.
Convidados confirmados para o Ato de abertura: Paulo Moraes, Secretário Executivo de Justiça e Direitos Humanos do Governo do Estado de Pernambuco, Fernando Coelho, Coordenador da Comissão da Verdade Dom Helder Câmara de Pernambuco, Paulo Geovani, presidente da Comissão da Verdade do Estado da Paraíba, Adriano Diogo, presidente da Comissão da Verdade de São Paulo Rubens Paiva, Perly Cipriano, ex-Diretor da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e ex-preso político em Pernambuco e Antônio Carlos Fon do Comitê Paulistano Memória, Verdade e Justiça.
Saudações de luta pelo direito à memória, à verdade e à justiça,

Edival Nunes Cajá (CMVJ-PE), José Calistrato (CMVJ-PB) e Roberto Monte (CMVJ-RN). 


Data do Encontro: 22 e 23 de Novembro de 2014
Local: Salão de Convenções do Recife Plaza Hotel
           Rua da Aurora, 225 - esquina com Av. Conde da Boa Vista
           Recife, PE
Credenciamento: dia 22 às 8:00 horas

Infância Roubada - Crianças atingidas pela Ditadura Militar no Brasil

Livro editado pela Comissão da Verdade de São Paulo “Rubens Paiva” traz histórias de crianças atingidas pela ditadura militar no Brasil, produzido pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. A obra foi lançada no dia 5 de novembro de 2014, na Biblioteca Mário de Andrade, no centro de São Paulo e será distribuída gratuitamente.

O livro reúne 44 testemunhos de filhos de presos políticos, perseguidos, assassinados e desaparecidos durante a ditadura civil-militar (1964-1985) no Brasil. Há, também, depoimentos das mães das crianças atingidas, com impressões sobre como viram a violência a qual seus filhos foram vitimados.

Cada testemunho é acompanhado, ainda, de fotografias, de acervo familiar e arquivos públicos, com o objetivo de resgatar a memória das famílias e a contextualizar o momento histórico, época em que crianças eram fotografadas e fichadas pelos órgãos de repressão. Há casos de crianças que, além de fichadas como “subversivos” e “terroristas”, foram banidas do país. Como Ernesto Carlos Dias do Nascimento, com dois anos; Zuleide Aparecida do Nascimento, quatro; Luis Carlos Max do Nascimento, seis, e Samuel Ferreira, nove; que foram banidos do país em 15 de junho de 1970, junto com 40 militantes políticos acusados de terrorismo. O decreto com o banimento foi assinado pelo então presidente Emílio Médici e pelo ministro da Justiça Alfredo Buzaid.

A publicação da Comissão da Verdade, presidida pelo deputado estadual Adriano Diogo (PT-SP), é resultado de um ciclo de audiências públicas realizado em 2013, com o objetivo de jogar luz e dar visibilidade às violências cometidas contra crianças durante a ditadura. Ainda não se tem dimensão do enorme espectro de abusos aos quais foram submetidos. As histórias colhidas na série de audiências eram, até então, em sua maioria, inéditas.

Mais sobre o lançamento do livro em Ponte Segurança Pública, Justiça e Direitos Humanos

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

NOTA DE SOLIDARIEDADE

O Comitê Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco (CMVJ-PE) vem a público manifestar a sua irrestrita solidariedade ao Promotor de Justiça de Defesa da Cidadania e Direitos Humanos do Recife, Dr. Westei Conde y Martin Júnior, por ter sido vítima de uma agressiva tentativa de impedir o registro fotográfico de uma Viatura da Polícia Militar, estacionada em local proibido em plena av. Boa Viagem, próximo do Parque Dona Lindu, na manhã do dia 22 de outubro do corrente ano. Os policiais da Viatura não estavam exercendo qualquer diligência na localidade, onde havia uma visível placa de “é proibido estacionar”.

Dr. Westei Conde sofreu, naquela ocasião, uma evidente tentativa de intimidação da missão da sua Promotoria, dada pelo Estado, através do Ministério Público de Pernambuco, de exercer a fiscalização e o controle da atividade externa da Polícia Militar de Pernambuco, com o objetivo impedir possíveis abusos, que infelizmente são frequentes no nosso estado.

Ora, neste caso, diante de um flagrante desrespeito à lei de trânsito, o Dr. Westei fez apenas aquilo que qualquer cidadão pode e deve fazer: fotografar, filmar, documentar e encaminhar à autoridade competente para as medidas cabíveis. E mais: a nossa Constituição Federal  recomenda a mesma atitude à cada cidadão brasileiro. Por que razão as infrações e demais erros cometidos por algum membro da PM não podem ser fotografados e levados à exame dos órgãos encarregados da sua fiscalização?

Seguramente, foi a quase certeza da impunidade, ao longo da ditadura militar, que tem levado alguns integrantes da PM à constantes práticas de abuso de poder e de violência nas abordagens, interrogatórios, nos trajetos para as delegacias  e presídios.

Dr. Westei, desde sua época de advogado, já tinha especial compromisso com a causa dos direitos humanos e integrava a histórica Rede Nacional dos Advogados Defensores dos Direitos Humanos e, certamente, inspirado na luta pelos direitos civis e sociais, é atualmente membro do Comitê Pernambucano Contra Tortura e do Comitê Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco (CMVJ-PE).

Assim, vimos também solicitar do Ministério Público de Pernambuco a apuração e a punição devida à esta evidente demonstração de abuso de autoridade daqueles policiais ao tentar impedir o dever do Promotor de Justiça de Direitos Humanos do Recife de exercer o seu trabalho e usar das necessárias prerrogativas para fiscalizar a atividade externa de uma Viatura da PM, em flagrante desrespeito à lei do trânsito da nossa cidade.

COMITÊ MEMÓRIA, VERDADE E JUSTIÇA DE PERNAMBUCO (CMVJ-PE)
Recife, 24 de outubro de 2014.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Exposição: Arte Política Tempos Dispersos de Resistência

A exposição Arte Política tempos Dispersos de Resistência foi pensada como uma narrativa visual que permitirá ampliar e amplificar as reflexões sobre os 50 anos do Golpe Civil Militar, debate esse proposto pelo VI Encontro Cultura Memória – evento organizado pela linha de pesquisa Cultura e Memória do Programa de Pós Graduação em História da UFPE, com o tema GOLPE DE 1964: CULTURA E MEMÓRIA. O encontro ocorrido entre os dias 22 a 25 de Abril de 2014, no auditório do Centro de Filosofia Ciências Humanas (CFCH) da UFPE, contou com a participação de intelectuais, entre eles a profa. Socorro Ferraz, integrante da Comissão da Verdade em PE; com a pesquisadora Marieta de Moraes (UFRJ); a pesquisadora argentina, Marina Franco (UNSAM/coincet- Argentina), entre outros, que vêm desenvolvendo pesquisas sobre o tema e relacionando-o às questões de nosso presente.
A mostra pretende construir uma narrativa visual que reúne trabalhos de artistas visuais brasileiros, um chileno e um romeno, numa coletiva. Selecionamos trabalhos que tocam em temas e em questões relacionados aos diversos impactos, ecos e reverberações das ocorrências marcadas pelas experiências da então chamada Ditadura Civil Militar e seu transbordamento temporal. Ainda, aquelas representações, ações e intervenções poéticas que articulam referências sobre e dos movimentos sociais, do ativismo, da arte política em outras geografias e temporalidades.
Artistas que, por meio de seus trabalhos, provoquem o debate e fomentem reflexões sobre as muitas maneiras de representação das experiências vivenciadas em situações limites, sejam elas, durante e em contextos de regimes totalitários e autoritários, como o corrido no Brasil entre 1964-1985, ou mesmo na complexa teia da construção democrática. 

Onde? GALERIA JANETE COSTA, Parque Dona Lindu
Abertura 10/05/2014 – às 17h
Período: 11 a 31/05/2014
Horário: Terça das 12 às 18h (reservado especialmente para agendamentos de grupos
Quarta a sexta das 12 às 20h
Sábado e domingo das 14 as 20h


Curadores e Pesquisadores responsáveis:
Antonio Paulo Rezende, Carolina Ruosso, Felipe Aretaxi, Flávio Weisntein, Joana D’Arc de Sousa Lima, José Brito e Pablo Porfírio

terça-feira, 6 de maio de 2014

Seminário vai debater ditaduras no Cone Sul


Terá lugar na cidade Santo André, ABC Paulista, entre os dias 09 e 11 de maio, o seminário Ditaduras no Cone Sul – 50 Anos Depois, que debaterá as ditaduras militares no continente latino-americano.
Com a presença de perseguidos políticos de diferentes países, o Seminário será um grande ato de repúdio às violações aos direitos humanos e pela punição aos torturadores do Brasil e dos demais países da América do Sul.
As inscrições para o Seminário são limitadas e feitas pelo site:
fonte: jornal A Verdade

domingo, 4 de maio de 2014

Por que o Brasil não julgou seus torturadores?

50 anos do golpe militar que depôs o presidente João Goulart para dar início à ditadura militar, um período de graves violações de direitos humanos e sociais. Cinco décadas passadas, será que a sociedade brasileira conseguiu estabelecer de fato uma democracia? Quais são os resquícios desse período na história atual? É o que analisa Dulce Pandolfi, socióloga, doutora em História e ex-diretora do Ibase, no texto abaixo, gentilmente cedido ao Canal Ibase. Para falar do assunto, ela traz à tona acontecimentos recentes, como a morte de Cláudia Ferreira, moradora de Madureira. Dulce apresenta-se de um duplo lugar de fala, enquanto historiadora e, ao mesmo tempo, vítima do Estado implantado pela ditadura iniciada em 1964. O texto foi elaborado para a conferência inaugural no Seminário sobre os 50 anos do Golpe, organizado pela Biblioteca Nacional.

No ano passado, a historiadora deu depoimento à Comissão da Verdade do Rio na Assembleia Legislativa do Rio  (Alerj), no qual chocou o país ao contar que havia sido torturada até com o uso de jacarés. E, além disso, trouxe à tona reflexões importantes sobre os resquícios da ditadura na sociedade brasileira atual, afirmando, em entrevista: “ Muitas formas de torturas ainda existem no país, como, por exemplo, no sistema carcerário e em comunidades. E a população não se mobiliza, encara como natural.”
Dulce Pandolfi

O que mais interessa discutir aqui é como se chegou à Lei de Anistia e qual o seu sentido para a sociedade brasileira. Qual a diferença entre perdão e esquecimento? Por que, diferentemente de outros países da América Latina, o Brasil não julgou criminalmente os seus torturadores? É possível sermos um país mais justo e democrático se esquecermos o nosso passado ditatorial? Por que a tortura, que existe desde tempos mais remotos e que não foi uma invenção da ditadura, continua sendo utilizada até os dias de hoje no nosso país, um país onde vigora um regime democrático, ainda que com muitas imperfeições?

Não por acaso – tortura e anistia – estão na ordem do dia. Dois acontecimentos recentes, talvez exemplares, podem ajudar na reflexão que estou tentando aqui fazer sobre o passado e o presente. Em primeiro lugar remeto ao depoimento do coronel Paulo Malhães na Comissão da Verdade do Rio de Janeiro e que foi publicado, em parte, no jornal O Globo no último dia 16/3/2014. Ao assumir a responsabilidade pelo desaparecimento do então deputado federal Rubens Paiva, preso em sua residência no Rio de Janeiro em janeiro de 1971 e cujo corpo até hoje não foi encontrado, o torturador Paulo Malhães, de forma didática, explicou porque, no período da ditadura, era melhor desaparecer com os inimigos do que simplesmente matá-los. Diz ele: “O desaparecimento é mais importante do que a morte porque causa incerteza no inimigo. Quando um companheiro morre, o guerrilheiro lamenta, mas acaba esquecendo. Não é como o desaparecimento que gera uma expectativa eterna”. Prossegue ele: “nada fiz além de cumprir meu dever. Se precisasse faria tudo de novo. Foi tudo racionalizado. Se precisar novamente, estou preparado. Tenho 76 anos, mas ainda posso dar instrução aos mais jovens”. Qual o sentimento que essa fala do torturador Paulo Malhães produz em todos nós, nos perseguidos pela ditadura, nos familiares não só de Rubens Paiva, mas nos familiares de todos os desaparecidos do país?

Por que é possível Paulo Malhães falar com tamanha naturalidade e audácia sobre crimes considerados de lesa humanidade e ainda afirmar que se preciso, fará tudo de novo? Esse torturador não deve ser processado e julgado pelos crimes que cometeu? O Estado brasileiro o anistiou? Enfim, qual o impacto que esse e outros depoimentos similares irão produzir na sociedade brasileira? Em segundo lugar remeto, a outro caso também recente e igualmente “estarrecedor, nefando, inominável, infame” como bem descreveu José Miguel Wisnik na sua forte e bela crônica publicada no jornal O Globo, no último sábado, dia 26 de março: o de Claudia Silva Ferreira, baleada no Morro da Congonha, no Rio de Janeiro, em circunstâncias ainda não esclarecidas. Jogada como carga no porta-malas de um carro policial a pretexto de ser atendida, Claudia foi “arrastada à morte, a céu aberto, pelo asfalto no Rio”. Prossegue Wisnik: “É uma imagem verdadeiramente surreal, não porque seja esteja fora da realidade, mas porque destampa (…) uma cena recalcada da consciência nacional, com tudo o que tem de violência naturalizada e corriqueira, tratamento degradante dado aos pobres, estupidez elevada ao cúmulo, ignorância bruta transformada em trapalhada transcendental, além de um índice grotesco de métodos de camuflagem e desaparição das pessoas”.

Como disse a filha de Cláudia, em entrevista a uma emissora de televisão, “nem cachorro mereceria o tratamento que deram para minha mãe”. Nunca é demais lembrar que um dos policiais que continuava fazendo seu trabalho de rotina, e que deu a Claudia um “tratamento que nem um cachorro merece”, já tinha anotado na sua ficha profissional a responsabilidade pela morte de treze pessoas. Esses dois casos são reveladores sobre o Brasil de hoje, e se tornam um bom prólogo para tecer algumas considerações sobre o “presente do passado”. Sabemos que o regime implantado com o golpe de 1964 que destituiu João Goulart da presidência da República teve várias facetas e muitas especificidades. Até hoje vencidos e vencedores disputam a memória sobre o ocorrido. A disputa começa pelo nome: aquilo foi um golpe, uma revolução ou uma contrarrevolução?

Um divisor de águas na história do país, o golpe de 64 também foi um divisor de águas na minha vida. Em Recife, minha terra natal, eu com 14 anos de idade, era uma entusiasta do governo Jango. Pernambuco era, no pré-64, talvez o estado mais comprometido com as tais reformas de base que tanto me fascinavam. Miguel Arraes, Francisco Julião, Gregório Bezerra, Pelópidas Silveira, Paulo Freire, as Ligas Camponesas, a Reforma Agrária, o Movimento de Cultura Popular, a Campanha de Alfabetização de Adultos, povoavam a minha imaginação. Minha casa era um local de muitos debates. Meu pai fazia parte de um grupo que se reunia nos finais de semana para discutir, arte, literatura, filosofia e política. Minha mãe, apesar de neta e filha de senhor de engenho era uma solidariedade só. Costumava dizer que a principal função do dinheiro era ajudar os mais necessitados.

Nos dias que antecederam o golpe, o clima visivelmente tenso. Mas, para mim, tudo parecia muito sólido. Por isso, no dia do golpe, meu mundo caiu. Tudo o que parecia tão sólido rapidamente se desmanchou no ar. Lembro do corre-corre, dos livros sendo queimados, dos estudantes baleados, do líder comunista Gregório Bezerra com uma corda no pescoço, sendo arrastado pelas ruas do meu bairro, pelo coronel Villocq Viana, um dos comandantes da Sétima Região Militar, em uma jipe do Exército brasileiro, recebendo dos militares “um tratamento que nem um cachorro merece”. Esse espetáculo ocorreu no dia 2 de abril de 1964. Logo depois do golpe, muitas também eram as notícias sobre as torturas e os desaparecimentos de inúmeros trabalhadores rurais da zona da mata de Pernambuco, inimigos mortais do regime militar, em função da projeção política que haviam conquistado no governo Jango que tinha como uma das suas principais bandeiras a reforma agrária. Sobre esses trabalhadores até hoje pouco se sabe. Em 1964 muitos não tinham nem documento. Embora atores importantes do processo, eram pré-cidadãos. De fato, o golpe pegou quase todo mundo de surpresa. Lembro também da véspera do golpe. Nós éramos vizinhos e amigos do então prefeito de Recife, Pelópidas Silveira. No dia 31 de março, antes de irmos para o colégio, meu pai preocupado com o clima político, teve uma rápida conversa com Pelópidas, no portão da casa dele. Ele nós tranqüilizou. Sabia que o comandante do IV Exército, Justino Alves Bastos, estava do nosso lado. No dia seguinte, tanto Pelópidas, como Arraes estavam presos e depostos dos cargos de prefeito e governador.

Só anos mais tarde entendi o porquê daquele otimismo. Segundo as análises do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que na época era uma força política importante, havia no Brasil uma contradição principal entre, de um lado, as forças do atraso, presentadas pelo latifúndio, apoiado pelo imperialismo, e do outro lado a tal da burguesia nacional, apoiada pelos setores da classe média e pelos trabalhadores. Juntos, em aliança, ajudariam o Brasil a sair do estágio pré-capitalista e se tornar um país capitalista. Completando o quadro, avaliava-se que setores expressivos das Forças Armadas, por pertencer à média ou à pequena burguesia, também estavam do lado do progresso e, portanto, alinhadas com Jango. Talvez por isso, o dirigente comunista Gregório Bezerra, no dia 1 de abril, ao chegar perto da sede do governo, em busca de apoio para tentar barrar o golpe que estava em curso, ao ver a sede toda cercada por policiais, escreveu ele, “fiquei animado, vendo muitos soldados da Polícia Militar limpando e lubrificando fuzis e metralhadoras. Pensei que estavam preparando-se para resisir aos golpistas!”

Poucas horas depois, Gregório, preso e torturado, estava sendo exibido publicamente pelos militares, como uma espécie de troféu de guerra. Aquela exposição pública de Gregório parecia querer demonstrar não só que eles, os militares, tinham vencido a guerra, mas também que o tratamento dos inimigos, no pós-guerra, ia ser pesado. Ao longo do período ditatorial, a despeito da intensidade, da modalidade e até mesmo da visibilidade ter variado, a tortura, a morte e o desaparecimento foram práticas adotadas pelo regime, como uma política de Estado. Por isso, no depoimento que dei à Comissão da Verdade, eu acusei os ex presidentes da República Humberto Castelo Branco, Costa e Silva, Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo. A despeito das divergências entre eles e das diferentes conjunturas em que chefiaram o país, todos, sem exceção, foram coniventes e responsáveis pela tortura.

Mas, a questão que fica é saber qual a memória que a sociedade brasileira construiu sobre a ditadura e mais particularmente sobre a tortura. Sem dúvida, há uma disputa de memórias. Ainda que de forma esquemática, gostaria de mencionar duas. De um lado, apesar das suas diferenças, a nossa visão, a visão dos militantes. Do outro lado, a visão dos militares e dos seus aliados civis, também com suas diferenças. Infelizmente essa ainda bastante cristalizada na nossa sociedade.

Leia o documento na íntegra


Fonte: Canal Ibase

sábado, 3 de maio de 2014

Ditadura nunca mais: filmes lançam luz sobre período obscuro da nossa história

É fundamental lembrar para não esquecer e impedir que esta página infeliz de nossa história se repita. Aproveite os filmes e boas sessões!

Confira no Porta Curtas a estreia de Ser Tão Cinzento, curta dirigido por Henrique Dantas que recria a memória do filme Manhã Cinzenta, do cineasta baiano Olney São Paulo, que foi perseguido e torturado pelos militares por conta do discurso libertário de sua obra. O curta traz depoimentos e usa as imagens originais do filme de Olney para narrar as atrocidades cometidas durante a ditadura militar.

A seleção também apresenta os curtas Projeto 68, de Julia Mariano, que compõe um impactante memorial de resistência contra os crimes praticados pelo Estado brasileiro; e Cartas da Mãe, dirigido por Fernando Kinas e Marina Willer, uma crônica sobre o Brasil dos últimos 30 anos contada através das cartas que o cartunista Henfil (1944/1988) escreveu para sua mãe, Dona Maria.

Por fim, você confere Enquanto a Tristeza Não Vem, de Marco Fialho, que traz um emocionante depoimento do cantor e compositor Sérgio Ricardo sobre o Brasil pós-golpe; e Ser Campeão é Detalhe: Democracia Corinthiana, que mostra a força política do futebol dentro e fora dos campos.

Equipe Porta Curtas

Sinopse de alguns dos filmes:



Projeto 68

http://portacurtas.org.br/filme/?name=projeto_68
Link para o filme
Passado e presente se fundem numa colagem de imagens e sons que nos levam de volta ao ano de 1968. Milhares de estudantes nas ruas e o recrudescimento do Regime Militar em imagens de Silvio Da-Rin, Glauber Rocha e fotografias de Evandro Teixeira e Pedro Moraes.

Cartas da Mãe

Link para o filme
Uma crônica sobre o Brasil dos últimos 30 anos contada através das cartas que o cartunista Henfil (1944/1988), que combateu a ditadura com sua arte, publicava no Pasquim e posteriormente na revista IstoÉ sob o pretexto de comunicar sua mãe, Dona Maria, das mazelas do país.

Enquanto A Tristeza não Vem

Link para o filme
Sérgio Ricardo, um dos personagens centrais da cultura brasileira de resistência dos anos 60, relembra o cenário de otimismo dos anos JK e os descaminhos da cultura a partir do golpe de 1964.

Ser Campeão É Detalhe: Democracia Corinthiana

Link para o filme
 Em meio a uma estrutura falida e conservadora, um clube brasileiro consegue alterar as regras do jogo. Não objetiva títulos, mas condições dignas de trabalho baseadas no diálogo e no respeito. 


Músicas para não Esquecer 1964

A Rádio Maíz, que faz parte do projeto do blogue sobre a América Latina, Diferente, Pero no Mucho, fez uma seleção especial de músicas para não esquecer nossos anos de repressão. A primeira parte do programa contempla 16 músicas e a segunda 15 música e encerrar com trecho do discurso de Jango na Central do Brasil em 1964.

Primeira Parte

Em um programa dedicado à memória sobre os 50 anos do golpe militar no Brasil, período no qual o autoritarismo regeu o país em descompasso e desafino com o pensamento livre, progressista e democrático, a Radio Maíz não poderia deixar de revisitar músicas de protesto consagradas e que marcaram época como as de Chico Buarque, Caetano Veloso, Tom Zé, Geraldo Vandré, Victor Jara, entre outros.
Por outro lado, ao acompanharmos, nas semanas em que se aproximaram ao quinquagésimo aniversário deste capítulo mórbido de nossa história, os sintomas de retrocesso em sujeitos das mais variadas faixas etárias, optamos por também contemplar canções atuais para mostrar os fantasmas e zumbis de 64 que rondam as nossas democracias.

Segunda Parte

Agora, tentamos através das próprias canções narrar uma história linear, música a música, da atmosfera social e política que delineou os tempos do golpe cívico-religioso-militar brasileiro.
A situação do homem do campo, vítima da exploração latifundiária cantada pelo Maranhense João do Vale, "O poeta do povo" na música "Sina do caboclo", abre o programa para fazer alusão a uma pauta importantíssima das chamadas "Reformas de base" anunciadas pelo então presidente da república João Goulart, deposto poucos dias após discursar para o povo no comício de 13 de março de 1964, na famosa estação Central do Brasil no Rio de Janeiro.

Rádio Maíz: Ouvidos Abertos aos sons da América Latina! 

quarta-feira, 30 de abril de 2014

Secretaria da Educação do Estado da Bahia - Projeto Ditadura Militar - Direito à Memória

Assista os depoimentos
Dentro das atividades relacionadas ao projeto Ditadura Militar – Direito à Memória: 50 anos do golpe de 1964, desenvolvido pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia, em parceria com a Secretaria de Cultura, a TVE está exibindo, no intervalo de sua programação, vídeos curtos de um minuto, protagonizados por personalidades que têm uma história de luta contra o regime militar. Os interprogramas também estão disponíveis no Portal da Educação.

Entre os entrevistados dos interprogramas da TVE, está o economista e professor Paulo Pontes, ex-preso político e atual chefe de gabinete da Secretaria da Educação do Estado. Outros nomes, como Sérgio Guerra, Oldack Miranda, Haroldo Lima, Emiliano José e Carlos Marighella Jr. também gravaram seus depoimentos.
Acesse o portal multimídia do projeto

Para o diretor de programação e conteúdo da TVE, o cineasta baiano José Araripe Jr., responsável pelo projeto de gravação dos vídeos, a emissora pública, com esse projeto, cumpre o seu papel de promover uma interface com a cultura e a educação. “Ter abraçado essa iniciativa da Secretaria da Educação e formatá-lo para a TV e para a Internet é, sem dúvida, algo bem gratificante, pois fecha um ciclo fundamental de interesse público: conhecer para não esquecer que a ditadura provocou muitos danos. Infelizmente, temos que relembrar para que estejamos sempre vigilantes”, declarou.

Como criador e cineasta, ao conceber o formato de interprograma e ir buscar no mercado o melhor perfil para realizá-lo – no caso, pelas mãos do diretor Geraldo Moraes –, Araripe Jr. se diz gratificado. “Ao darmos voz a esses personagens esquecidos, estamos fazendo história e permitindo às gerações mais jovens, principalmente os estudantes, que conheçam mais o País e que zelem pela democracia”.

Documentário: Filhos do Golpe

O Diário de Pernambuco lançou o especial online Filhos do Golpe, um webdocumentário composto por dez vídeos de caráter testemunhal em que filhos de políticos, militantes da esquerda e da direita, de desaparecidos e perseguidos pelo regime e de um militar que atuou na época da ditadura contam como viram e sentiram aquele período de trubulência.
Em depoimentos gravados em Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, doze filhos fazem
Assista aos depoimentos
confidências sobre si, os pais, a vida doméstica. Relatam o impacto do golpe nas relações individuais e familiares dos Arraes, Freire, Capistrano, Julião, Régis, Rolemberg, Vilarinho, Soares, Cruz, Silveira, Bastos e Santa Cruz. Revelam fragmentos de um passado e de um presente de Pernambuco durante o governo militar (1964/1985). São filhos de presos políticos, de desaparecidos, mortos, militantes da esquerda, governantes depostos dos seus cargos, de um civil morto e de um militar. Eles descrevem nos vídeos ao lado sentimentos em torno da ditadura que se instaurou no Brasil há apenas 50 anos, e de cujas repercussões ainda não se dimensiona.

É a dor da ausência paterna acalantada por uma gravação de voz em fita cassete. É o menino de cinco anos que, de tanto esperar um reencontro, duvida se a imagem do homem vista à distância é a do seu pai. É a história ignorada pelos livros didáticos, subestimada pelas Comissões da Verdade estaduais. E pela imprensa. É o Golpe Militar de 1964 no Brasil pelo viés dos filhos. Testemunhos pessoais, documentos orais de bastidores do antes, durante e depois do dia 31 de março de 50 anos atrás.

É a narrativa do filho que guarda cobertores usados pelo pai durante anos de prisão; do outro que chora ao lembrar o momento em que avistou o irmão levantar um lençol encharcado de sangue e viu o pai, morto. Do filho que ri ao lembrar que omitia a profissão do pai; do que crê ter apagado parte da lembrança para se poupar. É a memória de um coletivo que pouco se ouve.
por Silvia Bessa e Juliana Colares

domingo, 27 de abril de 2014

Nota da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo "Rubens Paiva" sobre o assassinato do Coronel Paulo Malhães

A Comissão da Verdade de São Paulo “Rubens Paiva” vem a público manifestar sua surpresa e preocupação com o assassinato do ex-coronel do Exército Paulo Malhães.
Segundo noticiado pela imprensa, seu corpo foi encontrado em sua residência na zona rural de Nova Iguaçu (RJ) e a polícia está considerando a hipótese de asfixia pelas circunstâncias do crime.
De acordo com o relato da viúva de Malhães, Cristina, e de sua filha, Carla, que se encontravam na residência, três pessoas ali adentraram e mantiveram o ex-coronel preso das 13h às 22h desta quinta-feira.
Há um mês, no dia 25 de março, o militar da reserva, que participou diretamente dos órgãos repressivos da ditadura, prestou depoimento à Comissão Nacional da Verdade revelando detalhes importantes sobre a execução sumária e a ocultação do cadáver de ex-deputado Rubens Paiva, além de outras informações sobre o funcionamento da chamada “Casa de Morte” de Petrópolis. As circunstâncias em que ocorreu o assassinato de Paulo Malhães, no interior de sua própria residência, sem que nada tenha sido subtraído e na presença de seus familiares, indicam a necessidade de uma apuração rigorosa e célere dos fatos para que se desvende, o mais rápido possível, a motivação desse crime.
São Paulo, 25 de abril de 2014.
Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”
Deputado Estadual Adriano Diogo - Presidente

sábado, 26 de abril de 2014

Atentado no Riocentro - Audiência Pública

A Comissão Nacional da Verdade apresenta na próxima terça-feira, 29 de abril, em audiência pública no auditório do Arquivo Nacional, no Rio de Janeiro, relatório preliminar de pesquisa sobre o atentado no Riocentro, ocorrido em 30 de abril de 1981, promovido por militares inconformados com os rumos da abertura política que vinha sendo promovida no país desde o final da década de 1970. O atentado no Riocentro não foi o único nesse período. Mais de 40 atentados a bomba foram realizados por grupos de extrema direita no Brasil entre setembro de 1979 e abril de 1981.
O objetivo do atentado era explodir bombas para causar pânico e mortes na população civil presente
no Riocentro em 30 de abril de 1981, onde ocorria show de música popular brasileira, organizado por artistas e sindicatos em comemoração ao dia do trabalhador (1º de maio), e atribuir a responsabilidade pelo atentado a grupos armados de oposição à ditadura. Entretanto, uma das bombas trazidas pelo chefe da seção de operações do DOI do I Exército, capitão Wilson Machado, e pelo sargento Guilherme Pereira do Rosário, explodiu no interior do Puma de Machado, ferindo gravemente o primeiro e matando o segundo na hora.
Parte da apresentação da CNV se baseia em documentos encontrados na residência do ex-chefe do DOI do Rio de Janeiro, coronel Júlio Miguel Molinas Dias, assassinado em 2012, em Porto Alegre. Os documentos foram apreendidos pela polícia civil gaúcha e a Comissão Nacional da Verdade recebeu cópia do acervo, em novembro de 2012, do governo do Rio Grande do Sul.
O material apreendido na casa de Molinas e entregue à CNV foi analisado pelo ex-membro da CNV Cláudio Fonteles, que produziu e divulgou um texto a respeito em maio de 2013. Acesse no link: http://www.cnv.gov.br/images/pdf/publicacoes/claudio/Atentado_Riocentro.pdf
Os documentos de Molinas sobre o caso Riocentro trazem anotações detalhadas sobre as atividades que ele, como comandante do DOI do Rio, desempenhou logo após o atentado. Na capa da documentação, Molinas informa que o relatório produzido por ele foi entregue ao coronel Leo Frederico Cinelli, chefe do serviço de informações do Estado Maior do 1º Exército, em 8 de maio de 1981, nove dias após a explosão da bomba.
A apuração da CNV também se baseia em outros processos que apuraram o caso, como dois Inquéritos Policiais Militares, realizados em 1981 e 1999, além de documentos produzidos pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados em 1996 e depoimentos colhidos pelo Ministério Público Federal.
Agentes públicos foram convocados e testemunhas foram convidadas para prestar depoimento durante a audiência.
O relatório preliminar de pesquisa sobre o caso Riocentro é o sexto que a CNV divulga desde 18 de fevereiro deste ano. Os cinco primeiros abordaram os seguintes temas: Centros de Tortura em instalações militares, Caso Rubens Paiva, Casa da Morte de Petrópolis, Centros Clandestinos de Tortura e Caso JK. Acesse a íntegra dos relatórios já divulgados e os documentos relacionados em: http://www.cnv.gov.br/index.php/relatorios-parciais-de-pesquisa
SERVIÇO
O quê: Audiência pública para apresentação de relatório preliminar sobre caso Riocentro
Quando: 29 de abril de 2014, terça-feira
Horário: 09h30
Local: Auditório do Arquivo Nacional, Praça da República, 173 – Centro, Rio de Janeiro
Transmissão ao vivowww.cnv.gov.br/aovivo
 
Comissão Nacional da Verdade
Assessoria de Comunicação

Nota da Comissão da Verdade do Rio sobre o assassinato do Coronel Paulo Malhães

Tudo indica que o assassinato do coronel Paulo Malhães, torturador e assassino confesso de presos políticos durante a ditadura, não foi um mero crime comum. Recentemente Malhães tinha dado depoimentos à Comissão da Verdade do Rio, confessando alguns de seus crimes e, inclusive, detalhando procedimentos usados para fazer desaparecer os corpos de presos políticos.

As circunstâncias de sua morte apontam para uma queima de arquivo e uma tentativa de intimidação de outros agentes do aparelho repressivo do regime militar que, porventura, estivessem também dispostos a prestar depoimentos sobre os anos de chumbo.

Por isso, consideramos essencial que a investigação do assassinato conte com a participação da Polícia Federal.

Ao mesmo tempo, esse crime mostra, mais uma vez, a necessidade imperiosa de que sejam abertos os arquivos militares da repressão política e esclarecidos os crimes cometidos nos porões da ditadura. Só assim poderemos virar essa página e consolidar a democracia em nosso país.
Wadih Damous
Presidente da Comissão da Verdade do Rio