Transcrevemos abaixo o capítulo "Violações de Direitos Humanos dos Trabalhadores" - págs: 55-86 do Relatório Final - volume II, Textos Temáticos - da Comissão Nacional da Verdade concluído em dezembro de 2014 (ao final da postagem link para baixar o texto integral do Relatório):
Este texto foi elaborado sob a responsabilidade da conselheira Rosa Maria Cardoso da Cunha. Os dados que o subsidiam e são apresentados foram reunidos e sistematizados pelo Grupo de Trabalho nº 13 da Comissão Nacional da Verdade, sobre Ditadura e Repressão aos Trabalhadores e ao Movimento Sindical (GT-13). Baseia-se em trabalho coletivo produzido por representantes de dez centrais sindicais brasileiras, comissões e comitês estaduais e municipais da verdade, entidades, associações, centros de memória de trabalhadores e organizações de trabalhadores ex-presos políticos. O GT-13 estabeleceu como linhas de investigação 11 temas, contando com o trabalho de pesquisadores. Nota1
Violações de Direitos Humanos dos Trabalhadores
A) Antes de 1964: os projetos político-econômicos contrapostos
Os trabalhadores e seu movimento sindical constituíram o alvo primordial do golpe de Estado de 1964, das ações antecedentes dos golpistas e da ditadura militar.Nota2 Essa afirmação evidencia-se pela violência anterior ao golpe, praticada nos estados em que os governadores, forças militares e policiais, articulados com o governo norte-americano, já estavam conspirando contra o governo federal, bem como pelos duros ataques, desde as primeiras horas, impostos aos trabalhadores e a seus órgãos representativos de classe. Evidencia-se, também, pelas políticas econômicas e sociais desenvolvidas pela ditadura militar e pelo número de vítimas das graves violações sofridas, na comparação com vítimas de outras classes sociais.
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O Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), organismo criado em 1962 para unificar e coordenar nacionalmente as lutas dos trabalhadores brasileiros, mobilizava-se, especialmente, por reivindicações como o aumento de 100% do salário mínimo, o novo rezoneamento desse salário, com a aproximação dos níveis salariais em todo o país, a aplicação efetiva do já instituído salário-família, o direito de greve, sem as restrições legais e práticas em curso, a redução do custo de vida, as lutas camponesas e o pagamento do 13º salário. O CGT apoiava, também, a elegibilidade para analfabetos e suboficiais das Forças Armadas e as reformas de base. Antes do golpe, o CGT — ele mesmo uma entidade não reconhecida pela estrutura sindical oficial — estava articulando uma proposta de reforma da estrutura sindical e defendia a autonomia e a liberdade dos sindicatos, o que seria discutido em seu congresso, que não chegou a ocorrer.
O segundo bloco organizava-se em torno do projeto de modernização conservadora proposto pela classe empresarial urbana. Do ponto de vista do campo, desde o início da década de 1950, a reivindicação mais vocalizada era a mecanização da agricultura. Em 1955, a Confederação Rural Brasileira — CRB, na III Conferência que realizou em São Paulo, qualificava como baixo o nível técnico da lavoura e da pecuária existente no país e enfatizava a “indiscutível conveniência de elevar-se a produtividade de nossa agricultura, seja em termos de área cultivada ou de força de trabalho empregada”.Nota3 Os proprietários de terra reclamavam, então, para eles próprios, créditos e assistência técnica, opondo-se radicalmente à extensão da legislação trabalhista ao campo, à associação dos trabalhadores em sindicatos e às reformas, em geral.
Os blocos mencionados tratavam os problemas econômicos e políticos em curso de forma completamente diferente. Consideremos como exemplo a greve de...